quinta-feira, 22 de julho de 2010

Muitos passarão...


Foi durante o pôr-do-sol de um domingo que aqueles passarinhos cantaram minha tristeza.
-Terei que partir – ele disse ainda deitado olhando o céu.
Eu estava com a cabeça em seu peito e pude ouvir o coração disparar. Não quis sair dali, não quis olhar praqueles olhos cor de esperança com turquesa que eu já via no céu. Fechei os olhos e suspirei.
- Tentei prolongar ao máximo essa partida, mas não consigo mais. Uma parte maior de mim acha que devo ir; embora uma parte inteira me mande ficar.
-Então por que vai? – Criei coragem e me apoiei sob o cotovelo para que pudesse olhá-lo. Ele sorriu, colocou uma mexa do meu cabelo atrás da orelha e passou a mão vagarosamente no meu rosto: testa, bochechas, nariz.
-Tenho medo de ficar e criar raiz. – Disse e me puxou para que deitasse de novo.
Esse era um medo que eu não podia questionar. Existem os que temem o vôo, a queda, a liberdade que a vida dá. E aqueles que temem o chão, afundar na terra e criar raízes, laços, a grade que a gaiola, mesmo segura, dá. Alguns nasceram pra partir e outros pra esperar a chegada. Uns foram feitos de pena e ar, outros de pedra e sangue.
-Querida, não ache que estou indo porque não te quero mais. Aliás, acho que vou porque te quero até demais. Dá medo querer uma pessoa tanto assim. Sabe que essa oportunidade já tinha surgido outras vezes, acho que é hora de aceitar. – ele disse passando a mão em meu braço acho que na tentativa de me esquentar por fora porque por dentro, passava a ser fria, uma tempestade inteira se instalara em mim. Chovia na alma, trovejava no lado esquerdo, escuridão densa na cabeça.
Foi quando um bando de pássaros passou por cima de nós.
-Acha que estão indo ou voltando? – perguntei.
-Hein?
-Os pássaros. Acha que estão indo ou voltando? – repeti.
- Acho que... Indo! Não sei! – ele riu confuso.
Abracei meu corpo fortemente junto ao dele e sussurrei para que ninguém mais descobrisse o que iria dizer:
-Pois toda viagem de ida é também uma viagem de volta, depende de como e quando você para pra olhar.
-O que quer dizer com isso? – sussurrou em resposta.
-Que você vai deixar saudade, mas quando achar seu lugar ao mundo, seu lugar seguro, quando descobrir onde ficar fará como esse bando e mesmo que parta, um dia vai voltar. – Falava isso com aperto no coração, quase não acreditava no que dizia, mas... Quem sou eu pra impedir um ser livre de voar?
Ele nada disse, eu nada questionei. Continuamos ali observando o pôr-do-sol e os pássaros que aos poucos iam partindo/voltando e levando com eles toda minha tristeza e dor de libertar aquele que eu mais gostei.
-Eu te passarinho! – ele disse.
-Eu te passarão!

Isa G.

6 comentários:

  1. Ah, Isa, lindo! "Lindo" é a palavra certa. Essa leveza que esconde a profundidade é tão envolvente! Parabéns, de novo e sempre! :)

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  2. Tanta sutileza e leveza criando uma atmosfera que prende a gente. Palavras que sempre deixam uma lição de moral ou uma marca em quem lê. Lindo, simples assim!
    Ah, saiba que ganhou um fã, todo dia passo por aqui :)

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  3. Suavamente encantador. Adorei aqui. Um beijo, moça.

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  4. Primeira vez que passo pelo seu blog e já me encanto assim, logo de cara!
    Lindo, simples e doce. Não há algo melhor para definir as suas palavras.
    Parabéns, conquistastes mais uma seguidora. :)

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  5. Obrigaada aos novos 'doceiros' e aos que já adoçam comigo! Tudo o que escrevo e faço aqui é pra que se sintam bem ao darem uma passada pelo meio amargo! :) Fiquem à vontade para sugerir, criticar, comentar! O meio amargo é um pouquinho de cada um! bjoss e obrigaada, sempre!

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